DÉBORA RODRIGUES DOS SANTOS

Por Lucas Castor em 7/4/25

 

A câmera está posicionada de cima para baixo. Débora olha para cima e chora.

Sim, sim, Doutor. Excelentíssimo. Escuto. Bom dia. Conversei, sim, conversei. Tirei minhas dúvidas. Mil novecentos e oitenta e cinco. Um meia três, casa A. Há dezoito anos. Eu fiz ensino superior. É. Não tenho doença. Eu tenho crises. Não, doutor. Não, Excelência. Perfeitamente. Ficou bastante cansativo. Entendi. As perguntas eu vou tentar responder. Eu prefiro ficar em silêncio. [Ininteligível]. Sim, não, tá perfeito. Sim. É. Não foi nada premeditado. Eu sou uma cidadã. Eu me deparei lá em Brasília. Eu não fazia ideia do bem financeiro e do bem simbólico. Faltou talvez um pouco de malícia. Eu não adentrei nenhum dos prédios. Eu só fiquei naquela praça. Eu tava tirando fotos. Eu achei os prédios, de fato, muito bonitos. Apareceu esse indivíduo. Eu sou uma mãe. Não fazia ideia, eu tava lá, mas não sabia. Sim, eu… Sim. Sim, Doutor. Certo. Certo. Totalmente ilegal e ilícito. Eu falei, “filho isso é ilegal; isso não se faz”. Eu não sei o que aconteceu comigo. Eu me arrependo. Eu não tava em mim. Eu saí pela avenida e fui andando e saindo do local. Isso, que é do lado de Paulínea. Cinquenta reais. Se alguém tinha batom, se alguém tinha gloss. Se colocar na minha frente, eu não seria capaz de reconhecê-lo. Doutora. Alto, branco, uma bandeira enrolada no pescoço. [Ininteligível], [ininteligível]. Boné verde não foi ele. Ele é um pouco mais moreno. Muita gente. De fato eu não consigo. Eu saía pra me alimentar fora. Domingo de manhã. Pequeno shopping. O QG. Oito quilômetros. Tinha bastante gente. Eu fiquei um pouco assustada. Aquilo me deixou um pouco em pânico. Tinha feito o “p”, a palavra “p”. Aquele gás que arde o olho. Eu ajudei um senhorzinho de idade. Porque eu ando mais rápido. Não era o propósito pelo qual eu tinha ido lá. Eu vi que aquilo não me representava. Eu já tava vendo o perigo. Doutora. Sim, Doutor. Eles passam por psicólogos. Eles não falavam muita coisa. Ele ficou muito fechado. Ele regrediu na fala. Ele ficou um pouco agressivo. Ele não entendia a situação. Organizar os pensamentos deles. Meu esposo falou que a psicóloga emitiu um laudo. Ela observou alguns comportamentos atípicos. Completamente, Doutor, completamente. Eu não quero me envolver nisso. Tudo o que eu quero é a paz do meu lar. Eu nunca mais me envolverei em nada. Realmente, isso me deixou traumatizada. Eu sou uma pessoa totalmente disciplinada. Então eu continuarei sendo uma pessoa. Eu queria pedir perdão. Saber que tudo tem um processo. Todo o país, ele depende de hierarquias. Eu entendi isso. Eu jamais tive essa intenção. É tudo o que eu preciso, só isso.


Esse é um texto editado a partir de trechos do depoimento de Débora Rodrigues dos Santos, a mulher que pichou a estátua da Justiça, em frente ao STF, nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Ela escreveu na pedra “PERDEU, MANÉ”. Para começar, transcrevi todo o depoimento de Débora. No material bruto, cortei palavras e frases. O primeiro resultado foi um texto em formato de poesia, muito parecido com o poema CID, que publiquei há um mês. Não gostei e quis tentar algo diferente. Minha intenção a seguir foi produzir um texto opaco, no qual se fala muito e se diz pouco. A regra à qual me submeti foi a de não alterar a ordem das palavras ditas por Débora, portanto “Sim” foi a primeira e “isso” a última, na cronologia do depoimento.


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