Resultado-Chamada-Revista #1
Kazimir Malevich - Black Square
Olhe ao redor. Palavras caem, caracteres escalam a superfície lisa. Lisa? O fundo não é neutro, o espaço em branco não é vazio. Escrever é um jogo de marcar dois espaços ao mesmo tempo: um pela força e o outro é o contra-ataque do que não pode ser escrito, para que qualquer coisa seja lida. Claro, com muita calma risca-se uma folha inteira com a caneta e em segundos preenche-se o fundo do Paint com um retângulo preto. Mas olhe de novo. Você apenas criou superfície para que o branco apareça. E ele vai aparecer, se é que já não está lá.
Ler da esquerda para a direita, horizontalmente, é apenas uma das várias formas de se ler. Variações do árabe, do persa e do hebraico usam a lógica direita-esquerda, também horizontal. Normalmente o japonês é lido não horizontal, mas verticalmente. E as palavras cruzadas.
Para a primeira edição da nossa revista, selecionamos textos que experimentam com a direção da escrita e com o contraste do espaço não-escrito como ferramenta importante da composição. Promovemos a escrita experimental, portanto nos pareceu fundamental considerar também a forma da nossa primeira publicação. Não haverá encadernação. Não passará de uma página, de uma folha, de uma impressão, de um quadro. É para ser pendurada na parede. Será literatura?
Os artistas selecionados para o #1 foram Maria Duran, Marcio Freitas, Gabriela Andrietta, Gabriel Migão, Cris Oliveira, Clara S. e Camila Filipa. Damos os parabéns e agradecemos pela ousadia de enviarem textos bastante… incomuns, para dizer o mínimo. Para edições futuras (pois imagine o conto de 60 páginas de João Ossua a ocupar todas as paredes da sua casa, por exemplo), selecionamos os textos de Julia Love, João Ossua, Gabriela Bandeira, Daniela Carvalho, Beta M. XReis, Ana Carolina Gomes, Amanda Santo e Alessandro Araujo. São obras experimentais em outros aspectos, e que não cabem no formato do nosso primeiro quadro. São tão ousadas quanto.
Uma última palavra sobre os textos que não foram selecionados. Este foi o primeiro trabalho de seleção de textos deste editor. Não é fácil. Li vários textos bons, que adorei e adoraria ver publicados, mas que, para mim, um homem latino (pois vivo em Genebra) de 36 anos, que nem se formou em Letras, que leu pouquíssima teoria literária, que leu pouca teoria literária sobre literatura experimental e que escreveu ainda menos literatura experimental, e que publicou somente um livro que não ganhou prêmio nenhum, e que muito provavelmente daqui a alguns anos vai olhar pra trás e ver que errou em vários pontos, bem, para mim esses textos não são experimentais. Espero que este projeto dê certo e que o corpo editorial cresça e se diversifique.
Muito obrigado a quem mandou texto, a quem ajudou a divulgar a chamada.
Do fundo da página,
Lucas